sexta-feira, 13 de julho de 2012

As Voltas que o Mundo Dá

- Vou abrir um curso de Cabo Eleitoral!
A moça loira entrou, eufórica, anunciando a grande decisão de sua vida.
Genésio, servidor público de quatro costados, indignou-se com a revelação:
- Curso de Cabo Eleitoral?
- É sim. Vou dar diploma e tudo.
- Pra que serve?
- Você está de brincadeira comigo, não é mesmo, Genésio?! - Indignou-se a moçoila da notícia.
- Estou não, senhorita!
- Serve para trabalhar na política, em favor de um candidato.
- Pra qualquer candidato?! - Agora, quem ficou indignado foi o barnabé.
- Qualquer um. Aquele que pagar mais. Depois de formado, o Cabo Eleitoral vai ao comitê e arruma o serviço. Com o diploma na mão, registrado e tudo, vai ser bem mais fácil.
- Espera aí. Vou pedir voto assim, sem conhecer o candidato, sem saber o que é que ele pensa...
- E daí? É tudo a mesma coisa! Você nem parece que é do nosso tempo!

Genésio - confesso - não estava entendendo mais nada. Seu tempo era outro. Aquele tempo em que as pessoas participavam das pugnas eleitorais, viviam a vida de seus candidatos, conheciam as suas ideias, os seus princípios, os seus objetivos políticos. "Mas - pensava ele - esse mundo dá tantas voltas!" . Genésio sentiu que tudo muda tão de repente, que a gente não consegue acompanhar a evolução dos tempos. "Também, pudera! - conversava ele com seus botões - "Passo os dias, os meses, os anos, enfurnado aqui nesta repartição, em meio aos meus processos, sem acompanhar nada que acontece lá fora..."
Genésio, absorto, perdido em suas reflexões, enquanto a moça loira destrinçava o projeto que iria por em prática.

- ...mais tarde, pretendo criar a Confederação Nacional dos Cabos Eleitorais. Essa é uma profissão como outra qualquer, o Ministério do Trabalho vai ter que reconhecê-la!
- Existem outros cursos iguais a esse no Brasil? - Arriscou o barnabé, temendo expor demais a sua ignorância.
- Não. A ideia é minha! Vou registrá-la no Departamento de Marcas e Patentes . - Respondeu ela, acrescentando:
- A gente não pode ter uma boa ideia aqui no Brasil, que logo aparecem as sanguessugas querendo copiá-la.
- É verdade. O mundo carece de gente criativa. - Limitou-se a concordar o modesto funcionário público, recolhendo-se às meditações que o reduziam à pessoa mais mal informada a respeito das mudanças que ocorriam no mundo.
- Um deputado, amigo meu, disse que vai mexer com os pauzinhos, lá no Ministério da Educação. O Ministério vai regulamentar o meu curso como Curso de Nível Superior...
Genésio viajava em seus pensamentos, e a moça falava:
- ...brevemente, vai ser a Faculdade do Curso Técnico de Cabo Eleitoral. Quem sabe, amanhã, a gente a transforme numa universidade. A Universidade...- Parou um pouquinho para pensar, e concluiu - ...a Universidade de Agentes Especializados em Pesquisas Eleitorais!
- Bom ! - Exclamou, sem muita convicção, o barnabé.
- Bom, nada! Ótimo!!! Será um grande passo para a valorização do servidor público, que ganha um salário de miséria, de fome !
- É mesmo. - Mais uma vez, concordou Genésio, pensando no seu próprio salário. Ganhava pouco, e não tinha aumento salarial há oito anos. A moça da notícia não se continha:
- Nós, funcionários públicos, merecemos mais atenção dos governos.
- Ah! Você também é servidora pública?
- Sou. Há mais de três anos.
- Lotada onde?
- Na Secretaria de Administração.
- Presta serviço em qual repartição?
- O quê?!
A abrupta reação da moça, demonstrando estranheza pela indagação do modesto barnabé, deixou-o meio atrapalhado, tentando explicar-se melhor:
- Eu...bem...eu...queria dizer o seguinte...Em qual repartição você está trabalhando?
- Você acha que eu, com um salário desse, ainda vou trabalhar?

O pior de tudo é que o Genésio achava...
Realmente, ele andava por fora  das mudanças que ocorreram no mundo.

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